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ICMS: Julgando modulação da ADC 49, STF tenta conter guerra de crédito fiscal

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Tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) desde 4/9/2017 a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 49, proposta pelo estado do Rio Grande do Norte objetivando a declaração de constitucionalidade acerca da incidência do ICMS nas operações de transferência de mercadoria, disposta nos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, § 4º, da LC Federal 87/1996 (Lei Kandir).

O estado sustenta que estabelecimentos, ainda que do mesmo contribuinte, são considerados autônomos pelo art. 155-§2.º-XII-d da CF e pelo art. 127-II do CTN e como tal, pretende justificar a incidência do ICMS em transferência, inclusive em operações interestaduais.

Noutros termos, o objetivo da ADC 49 é a superação da Súmula 166 do STJ, que há muito tempo firmou entendimento jurisprudencial contrário a essa incidência, bem como a constitucionalização do teor da lei Kandir, validando a incidência do ICMS nas transferências, defendida por inúmeros estados nos respectivos regulamentos.

Em 19/4/2021, o Pleno do STF, por unanimidade, julgou improcedente o pedido formulado na ADC 49, declarando a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, §4º, da lei Kandir (LC 87/1996) nos termos do voto do relator ministro Edson Fachin.

Com isso, o STF ratificou desde 2021 o entendimento adotado na Súmula 166 do STJ, ao consignar que a hipótese de incidência do tributo é a operação jurídica praticada por comerciante que acarrete circulação de mercadoria e transmissão de titularidade ao consumidor final.

Nessa esteira, em 13/5/2021, o estado do RN opôs o recurso de embargos de declaração, pleiteando a modulação dos efeitos da referida decisão, com objetivo de que ela tenha eficácia apenas futura e trazendo à tona a necessidade de os ministros esclarecerem as consequências supervenientes quanto à titularidade dos créditos apropriados em etapas anteriores por contribuintes que deixarem de destacar o ICMS nas saídas interestaduais.

Bem da verdade, o pleito reside na tentativa de limitar pedidos generalizados em âmbito nacional, de repetição de indébito e afetação de litígios fiscais em curso (judiciais e administrativos).

É notório que estamos diante de um novo capítulo muito sensível na matéria de saldo credor e via de consequência, concessão de incentivos fiscais de ICMS, dessa vez com enfoque na titularidade e gestão desse saldo credor, e aqui reside o risco das cooperativas de se depararem com uma nova modalidade de guerra fiscal: a guerra de crédito fiscal de ICMS.

A depender da configuração da decisão final do STF (definição dos termos da modulação), alguns estados poderão passar a exigir das cooperativas o estorno de créditos apropriados nas operações anteriores, o que pode afetar diretamente a concessão de incentivos e até mesmo, termos e condições pactuados em regimes especiais.

Em outras palavras, o que está em pauta no STF é a definição sobre qual estabelecimento (remetente ou destinatário) terá direito de usar o saldo credor apropriado em etapa anterior, e qual estado terá efetiva competência sobre o débito da operação (arrecadação) ou figurará mero acumulador de crédito.

Nesse cenário, cooperativas que transferem mercadorias para inúmeros estados, por conta de uma série de fatores (logísticoseconômicos e estratégicos), poderão ter de repensar os planejamentos no meio do exercício fiscal, justamente por conta da disputa que poderá ser firmada entre os estados, especialmente os que correm o risco de sofrer redução ou extinção de arrecadação de ICMS.

O julgamento dos embargos de declaração já gerou uma série de debates acalorados no plenário do STF, tendo sido pautado e suspenso inúmeras vezes por conta de sucessivos pedidos de vistas dos ministros, e conta com o placar provisório de empate.

Até o presente momento, dos 11 ministros, quatro acompanham com adendos a proposta de modulação do relator, ministro Edson Fachin, e outros quatro acompanham com outros adendos o voto divergente do ministro Dias Toffoli.

Ambas as propostas preservam a inconstitucionalidade da incidência do ICMS nas transferências e a necessidade de resguardar litígios (administrativos ou judiciais) em curso ajuizados até a definição de mérito pelo STF nesses autos da ADC 49 (4/2021), mas divergem quanto ao início da eficácia da decisão e quanto a forma de se solucionar a transferência dos créditos apropriados em operações anteriores (divergência quanto aos efeitos futuros).

Para o ministro relator, é adequado que os próprios estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos do mesmo titular e sugere que seja feito a partir do próximo exercício financeiro (2023), e havendo esgotamento desse prazo sem atendimento, fica reconhecido o direito de os próprios sujeitos passivos transferirem tais créditos.

Já para o ministro Dias Toffoli, que abriu a divergência ao referido voto, é mais adequado que essa regularização normativa acerca do direito à não-cumulatividade do imposto (numa perspectiva tanto dos contribuintes quanto dos fiscos estaduais) seja providenciada por meio da edição de uma Lei Complementar Federal que deverá ser permeada por um debate técnico e mais assertivo no Congresso Nacional, sugerindo para tanto o prazo de 18 meses para tal finalidade, contados da data de publicação da ata de julgamento dos presentes embargos de declaração.

Apesar dessas considerações, o ministro Toffoli não prevê regramento para a transferência de créditos de entrada para os demais estabelecimentos do mesmo proprietário. Sobre o tema, ele comenta que uma vez não havendo regulamentação sobre tais créditos, os contribuintes poderiam recorrer ao judiciário.

Restam pendentes os pronunciamentos de três ministros, André Mendonça, Rosa Weber e Gilmar Mendes.

O caso está pautado para julgamento virtual, que deve iniciar nesta sexta-feira, dia 31/3/2023, e deverá ser concluído até 12/4/2023. Importante dizer que no panorama atual, não existe possibilidade de modulação, eis que para modular em ação de controle de constitucionalidade é necessário o quórum qualificado de ministros.

Nesse momento, cabe a cada cooperativa avaliar o impacto que as teses propostas para modulação podem desencadear nas operações e acionar os departamentos jurídicos para avaliação de riscos e tomada de decisões, especialmente sobre o impacto nos litígios em curso ou a necessidade de uma medida judicial preventiva.

Leilaine Pereira, advogada especialista em direito tributário do Martinelli Advogados no Paraná

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